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30/01/2017

Crónica da anunciada avaria irreparável da geringonça (68)

Outras avarias da geringonça.

Começo pela paródia da redução da TSU em que Costa esperava que Passos Coelho e Cristas fizessem os papéis de Jerónimo e Catarina na peça por ele montada e em exibição em todos os teatros nacionais desde a estreia em 26-11-2016.

E ainda a propósito da redução da TSU, rejeitada pelo PCP e as suas sucursais, Arménio Carlos, o ministro do Trabalho da geringonça, deixou em nome da CGTP sérios avisos: «se permanecer nesta perspectiva, naturalmente que isto terá consequências do ponto de vista da contestação popular».


Apesar do óbvio falta de interesse em antecipar eleições por parte do BE e também do PCP, torna-se cada vez mais claro que esgotada a agenda da «reposição», bloquistas e comunistas precisam de dar prova de vida e apresentar novas «reivindicações», como o aumento dos dias de férias que foi chumbado pela oposição e o PS. Já quanto à transformação de bolseiros, pré-doutorados, em doutoramento, doutorados e pós-doutorados em escriturários com emprego vitalício a geringonça alcança a unanimidade.

Com excepção da geringonça e dos economistas da Mouse School of Economics, o resto do mundo continua a prever um crescimento medíocre inferior à média europeia. É o caso da Coface, uma seguradora de crédito, que mantém a classificação do risco de incumprimento das empresas portuguesas e antecipa que o aumento de salários (sem aumento de produtividade) vai reduzir a competitividade.

Se a descida de um lugar para 29.º no ranking da Transparência Internacional com uma pontuação de 62 pontos em 100 não é uma boa notícia, a classificação de Portugal no Índice de Democracia da Economist Intelligence Unit como democracia defeituosa também não é caso para nos alegrarmos com o 19 que o presidente Marcelo nos (se) atribuiu em «prestígio internacional» numa das suas perfomances recentes.

Para quem achar exagerada a descida no ranking da Transparência Internacional podemos dar como exemplo a recusa da administração do banco público Caixa, contra uma decisão do Tribunal da Relação de entregar a documentação pedida pela comissão parlamentar de inquérito, nomeadamente a «lista de créditos maiores por si concedidos». Recusa que se percebe sem dificuldade porque exporia a utilização da Caixa durante anos como instrumento dos governos (sobretudo socialistas) para ajudar os amigos e empresários do regime e transformar empresas independentes em empresas do regime, O resultado, segundo uma estimativa de António Esteves (ex-Goldman Sachs) que apresentou uma proposta de compra do malparado, são 4 mil milhões de crédito malparado não provisionado só na Caixa.

Em 2016, em plena governação da geringonça, a dívida pública directa cresceu 4,4% em relação a 2015 e atingiu 236,3 mil milhões de euros ou 128,9% do PIB e era no final do 3.º trimestre a segunda maior da Europa em percentagem do PIB. Como um défice de 2016 que o governo garante não ter ultrapassado 2,3% gera um aumento de 4,4% da dívida (ou mais de 5% do PIB) é um mistério que a seu tempo se desvendará. Mesmo a um mistério menos misterioso (qual o défice sem as medidas extraordinárias e os cortes no investimento público) que Passos Coelho pediu a Costa para esclarecer, este retorquiu «terá a resposta quando o diabo cá chegar». Sendo esta saída de Costa a pura verdade, isso converte-o numa espécie de M Jourdain que fazia prosa sem o saber.

Enquanto a dívida pública cresce todos os dias a solução de Costa é a solução socialista por definição: eurobonds - traduzido em língua corrente o socialismo insolvente português pede dinheiro emprestado e o capitalismo solvente garante o pagamento. Tudo isto faz recordar os tempos anteriores ao resgate e ainda mais se acrescentarmos estar a banca portuguesa novamente, como então, a comprar dívida com abundância - 14,2 mil milhões no ano passado até Novembro.

Por isso, e apesar do outlook do presidente Marcelo, na sua encarnação de analista financeiro, os yields da dívida a 10 anos, depois de terem descido para abaixo, voltaram a subir para acima. E não só a dívida soberana, também a EDP que tinha emitido mil milhões em Agosto do ano passado a 8 anos com uma taxa média de 1,2% este ano para colocar 600 milhões com o prazo de 6 anos teve uma taxa média de 1,9%.

Os ministros das Finanças da Zona Euro, contrariando o optimismo marcelista, costista e centenista, alertam para «riscos relevantes no médio prazo». Apesar de tudo, o médio prazo é boa vontade deles, E também insistem nas reformas, o que, percebe-se, é só conversa para adormecer porque eles sabem perfeitamente que as reformas da geringonça consistiram em contra-reformas, na reposição, restituição e outros re-qualquer coisa. Só que no meio das tempestades que assolam a União eles pedem a todos os santinhos que os tugas os não chateiem.

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