Our Self: Um blogue desalinhado, desconforme, herético e heterodoxo. Em suma, fora do baralho e (im)pertinente.
Lema: A verdade é como o azeite, precisa de um pouco de vinagre.
Pensamento em curso: «Em Portugal, a liberdade é muito difícil, sobretudo porque não temos liberais. Temos libertinos, demagogos ou ultramontanos de todas as cores, mas pessoas que compreendam a dimensão profunda da liberdade já reparei que há muito poucas.» (António Alçada Baptista, em carta a Marcelo Caetano)
The Second Coming: «The best lack all conviction, while the worst; Are full of passionate intensity» (W. B. Yeats)

11/05/2017

AVALIAÇÃO CONTÍNUA: O efeito do tempo sobre o pensamento miraculoso (ACTUALIZAÇÃO)

Secção George Orwell

De cada vez que a fé keynesiana esmorece ou que falta o dinheiro dos contribuintes para as obras públicas, alguém descongela o professor doutor Alfredo Marvão Pereira e lhe coloca um gravador à frente. O professor doutor Marvão Pereira, catedrático no Departamento de Economia do College of William and Mary nos Estados Unidos, é o teórico das SCUT que em parceria com Jorge Andraz publicou em 2006 o estudo «O impacto económico e orçamental do investimento em SCUT».

Naquele estudo, as duas luminárias usaram um modelo econométrico que lhes permitiu demonstrar que por cada milhão de euros que o governo investisse em infra-estruturas rodoviárias o efeito acumulado no PIB seria de 18 milhões de euros a longo prazo. Como o custo total das SCUT até 2051 foi estimado em 26 mil milhões, a «longo prazo» o PIB a preços constantes cresceria uns 468 mil milhões ou seja o equivalente a quase 3 PIB de 2006. Se houvesse dúvidas sobre a bondade do modelo econométrico estariam desfeitas cinco anos depois com a chegada da troika para resgatar o país na bancarrota.

Dez anos decorridos, a luminária do multiplicador vem explicar-nos em entrevista ao jornal i com o título «Podemos ter autoestradas a mais, mas os nossos netos vão ficar muito contentes por tê-las» que o falhanço das SCUT se deve à introdução das portagens – sem elas, as AE em que hoje percorremos quilómetros sem ver um único veículo estariam coalhadas deles e, evidentemente, o PIB multiplicar-se-ia. Vem também alertar-nos para os preconceitos contra o investimento público, agora que a geringonça aprovou um orçamento que reduziu o investimento público em 5,6% em relação ao orçamento neoliberal.

Decorrido um ano depois dos dez, a mesma luminária do multiplicador expõe num artigo do Público, surpreendentemente intitulado «Mais investimento público, sim, mas com rigor», várias conclusões das quais destaco: (1) em contradição com tudo o que nos havia dito antes, afinal nem todo o investimento público é «bom» e aceita que, apesar de tudo o que ele defendeu, no passado houve «investimento indiscriminado» e (2) reconhece que passámos «dos 80 para os oito. Do investimento indiscriminado do passado à (quase) ausência de tal investimento no presente».

Ou seja, Marvão Pereira revê as suas teses do milagre do multiplicador que transformaria um qualquer milhão investido pelo Estado, fosse lá no que fosse, em muitos milhões a longo prazo (e não, para ele não seria em dívida - hipótese realista - seria em aumento do PIB) e confirma aquilo que o governo não tem reconhecido - o investimento público, bom, mau ou assim assim, foi pura e simplesmente obliterado para cumprir o défice e garantir o óleo do BCE para a geringonça.

Depois dos 5 (cinco) bourbons e dos 5 (cinco) bourbons dos 5 (cinco) chateaubriands como prémio de carreira, atribuo-lhe agora um afonso por este reconhecimento tardio.

Outros posts do (Im)pertinências sobre o mesmo tema:

Sem comentários: